20 agosto 2010

A DESPEDIDA DE UM AMOR

Sei que vou sofrer por muitos dias. Talvez meses e anos, mas não importa. Saí dessa. De um amor tóxico que me consumia e fazia com que eu tremesse só de pensar que podia escapar de dentro de mim e eu despencar. Talvez pudesse ter tomado essa atitude antes, mas não deu. Era preciso lutar internamente. Transformar meus sentimentos. Desacelerar a ansiedade que saltava do peito para viver algo bombástico que me fazia tão mal.
É ruim ser refém de algo na vida. Seja o que for é negativo demais. E um homem que abusa das fragilidades de uma mulher é de matar. Ele às vezes nem tem intenção de machucar, mas machuca. Tem cara de bonzinho, carinho gostoso. Mas é puro veneno. Não que traga os frascos nos bolsos e use-os com intenção de contaminar. Pior do que isso: faz sem medir conseqüências. Não percebe o mal que faz, porque sua estrutura permite usar alguém para se sentir fortalecido. Em resumo: você é o contrapeso que o faz estar equilibrado, nada mais.
Mas tenho que ser forte. Ter força e munição necessária para conseguir fugir dos pensamentos que ameaçam minha decisão. Da saudade do seu toque. Das palavrinhas mágicas que usa muito bem. Olhar que só agora percebo tão vazio. Talvez um homem-blefe. Possuído pela mentira, mesmo sem saber. Vai aqui um toque de perdão, não se pode julgar e condenar, mas tem pessoas que sabem fazer sofrer. Possuem o dom de transformar as coisas conforme sua vontade. Ficam bem e nós muito mal. Que continuem por aí com sua doença, mas longe de mim.
Essa despedida me faz pensar nos anos que vivi frustrada. Tão escorregadio, sempre com desculpas e o pior é que essa "coisa' preenchia minha vida. Que imenso buraco afetivo estava dentro de mim para que ele se aconchegasse com seu ar blasé e indiferente ao que acontecia.
O que fiz com a minha vida? Escolhas erradas acentuadas por um olhar míope. E é melhor ficar quieta quando não se sabe o que fazer. Ficar distante de tudo que lembre esse blefe. Desligar o celular, porque assim não fico olhando para ver se toca. Nem ver cenas de sexo ou românticas na TV, porque meu corpo vai sentir saudade daquela inverdade que o consumia.
Tenho que me despedir do amor bandido que sempre tinha o gatilho acionado para mim. Ferida, mesmo assim, saio dessa enrascada e quero construir um novo mundo para minha vida. Se ele me quisesse já teria tomado providências. Duro escutar isso. Dói como ponta de faca no peito, mas é a pura verdade. Homem quando se interessa por uma mulher, corre atrás. Faz qualquer coisa para tê-la ao seu lado. Não faz sofrer nem deixa para lá o que sente. Se fosse digno, já teria saído desse jogo de ilusões e deixado a minha vida se refazer .
Se continuar a dar permissão para que esse homem-blefe continue fazendo parte de você, pode estar certa que não desiste nem por um decreto. Se tiverem sexo bom, então, jamais vai se afastar dos encontros tórridos. Mas volta para a sua vidinha medíocre, seja ela qual for.
Despedir-se de um amor não é fácil. É doído. A raiva vem com força de tanta frustração. O medo de ficar sozinha outra vez. Sozinha? E tinha companhia de verdade? Continuar desesperada imaginando que vai acontecer um milagre é imaturidade demais. Sem esperança, não tem como alguém ser feliz.
Talvez pense ser impossível, mas não é. Como um alcoólatra em tratamento, viva um dia de cada vez. A gente aprende a ler e a escrever dessa maneira. Primeiro o A, depois o E , e assim por diante. No alfabeto da vida também assim acontece. Passos de formiguinha, um a um, mas com competência. Se deixar para lá, como vai poder enxergar a realidade que ronda o seu coração? Aprenda a se defender. Comece a se exercitar. E mãos a obra em direção a liberdade.
Sai dessa amiga. Para de chorar. Olhe em volta e veja os milhões de oportunidades em torno de você. Está enganada, não precisa dele para se sentir inteira, você é inteira. Chega de atiçar o fogo, porque quando a fogueira espalha suas labaredas, fica difícil escapar do perigo. Providencia a maneira de sair da tristeza que sente. Não espere uma solução mágica, quem está no comando de sua vida é você. Aliás, só para lembrar - ela pertence a você e não a ele, ou outro alguém.

BETH VALENTIM
(psicanalista e escritora)

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